O que distingue um filme “pornô” de um filme “erótico” que exibe cenas de sexo explícito é ausência do tripé formado pela chupada, metida e gozada presente no pornô quase invariavelmente nessa ordem. Essa estrutura narrativa, com três bases, foi estabelecida nos anos de 1970, em filmes gays e heteros, e permanece válida até hoje com pouca alteração. Logo depois o gênero ganhou o conceito irretocável de que filme pornô é todo aquele cujos protagonistas são as genitálias dos atores. Não há dúvida de que Swallow it straight boy (Cum Pig Men, 2008) é um filme pornô porque lá estão as genitálias protagonistas, mas este filme, lançado recentemente, simplifica a estrutura narrativa, reduzindo-a para apenas chupada e gozada. Engolir não faz parte da estrutura, é ornamento e luxo.
Pode a metida ser suprimida e um filme permanecer interessante? A resposta é afirmativa desde que mantenham pelo menos uma base de apoio, são os conhecidos pornôs cantilever, que os filmes solo exemplificam tão bem. Os filmes estilo bareback oral degustativo têm duas bases. Há a possibilidade de fazer bons filmes eliminando a chupada e exibindo apenas metida e gozada. O que parece impossível é eliminar a gozada.
Quem duvida da qualidade de um filme apoiado nessa estrutura deve assistir Swallow it straight boy para ter certeza de que se o filme perde um pornomilímetro aqui ganha outro ali e, no final, o espetáculo é compensador. O diretor Leo Greco, com poucos filmes na carreira, parece já muito seguro do que faz. Ele deu um chute nos traseiros e centrou a atenção em duas fantasias que o protagonista Lance Brady desenvolve na ponta da língua: a alegada heterossexualidade e na natureza mamífera do homo sapiens. A atenção não está na técnica de caça ou na garganta de Brady, tão profunda e hábil quanto à de Linda Lovelace, sem ser um caso clínico de anomalia anatômica nem uma versão pornô de Gargântua. As as qualidades físicas do intérprete apóiam as fantasias nas quais o roteiro se baseia. Brady e todos aqueles que hoje têm menos de 30 anos são filhos de mães e pais chupadores de pau que se formaram com as tele-aulas dos pornôs de antanho. Essa geração pode comprovar a teoria da evolução de Lamarck do uso, desuso e herança dos caracteres adquiridos, melhor do que ratos de laboratório.
O interesse por homens heterossexuais é uma fantasia recorrente do universo pornô gay que se explica quando se considera que eles nada mais são do que “gays virgens”. Esse interesse é o velho culto à virgindade, na opinião de muitos, deplorável. É numerosa a produção de filmes que garantem que os atores são de “fora do meio” como se houvesse aí alguma vantagem competitiva em relação aos que são “do meio”. Homens heterossexuais, em inglês coloquial, são denominados de straight, substantivo que pode ser traduzido para direito, reto, correto, honrado, honesto. Seu uso corrente faz supor que, para os anglófonos, todos os relacionamentos que não sejam o sexo entre homem e mulher são desviantes. Em nossa língua inexiste um termo coloquial para designar homens e mulheres heterossexuais. A palavra careta, uma gíria corrente no desbunde dos anos 70, nomeava os adeptos do sexo exclusivamente hetero e também aqueles que não possuíam vícios dignos de nota. Como a palavra straight não foi adotada pelo português ela precisa de tradução, ao contrário da palavra gay, que dispensa. Careta poderia ser a palavra mais adequada na tradução de straigh não houvesse seu uso se tornado tão pouco freqüente. Há quem reconheça certa heteronormatividade social no uso da palavra straight não percebida pelo uso irrefletido. O certo é que esse substantivo, no sentido em que é empregado, causa estranhamento para quem não está familiarizado com o idioma de Shakespeare. O título do filme pode ser traduzido, de uma forma “livre” e concisa, como Engole macho, com o verbo no modo imperativo, embora Lance Brady não encarne o papel de submisso, tampouco faça o contrário. Com aquele olhar de pidão, ele imprime emoção de ária a um boquete casual. De boca ele poderia dominar o mundo, desde que só houvesse homens.
O contato íntimo com fluido seminal deve ser feito com parcimônia, contudo é grande o interesse por parceiros que chupam e engolem, não sendo essa uma fantasia restrita às telas do pornô ou à certas práticas kamikazes. Na vida real a ausência desse mimo entre os parceiros pode até determinar o sucesso ou fracasso de um relacionamento. Essa sabedoria saiu da boca do povo para virar arte. Todas elas, menos arquitetura, representam o boquete. Quem tenha pelo menos um homem na vida sabe o poder do boquete. As publicações femininas começaram a dar amplo amparo teórico à essa prática não-procriativa de sexo. Numa época em que as relações são menos estáveis, as mulheres parecem ainda mais dispostas a artifícios para não perder o parceiro sem que seja necessário recorrer ao truque de usar Corega como gel lubrificante. Houve mudanças de hábitos, em vez da culinária, hoje o boquete é a maneira usual de pegar o marido pela boca. Há alguns anos atrás uma revista publicou uma matéria que afirmava que não há maior prova de amor do que o hábito de engolir o esperma do companheiro, o título da matéria era A dieta do amor. A dica número 160 do livro de Olivia St. Claire, intitulado 203 Maneiras de Enlouquecer um Homem na Cama (Ediouro, 1999), trata do assunto de maneira enaltecedora, em detalhes, com dicas valiosas, terminando por dizer que engolir o sêmen do amante é uma “oportunidade de (...) formar um elo muito especial com seu homem”. Não precisa ser mulher para acreditar nisso, em Swallow it straight boy, o personagem vivido por Lance Brady, straight a seu modo, está mais interessado em pegar a maior quantidade de parceiros galantes, dispostos a espalhar sêmen, do que em formar um elo “muito especial” com quem quer que seja. O único elo pretendido no filme é aquele que liga platéia ao espetáculo.
Lance Brady é um ator que está se lançado internacionalmente com esse filme. 21 anos, aparência mediana, cabelos negros, um glutão do Michigan que decidiu ir para Nova York, ele não faz o tipo caipira desconfiado, longe disso, parece estar inteiramente ambientado, andando pelas ruas, abordando homens. Quando não está nas ruas aborda-os por telefone e leva-os para um cafofo de dois vãos apenas. O ponto negativo é que Brady interpreta muito mal sua alegada heterosexualidade quando, no prólogo do filme, sentadinho na cama em pose de Cleópatra, ele fala de si mesmo, um dos poucos momentos em que não está com a boca ocupada. Ele narra como foi descoberto e começou a carreira de ator pornô gay. Ser um astro ascendente em plena Nova York é um sonho que muitos rapazes do interior desejam realizar. Para uma maior consistência do personagem talvez fosse mais adequado classificá-lo menos e inserir cenas dele com uma figurante, num papel não-sexual, para reforçar a ficção. É intrigante constatar que nem mal interpretados existem filmes com supostos "ex-gays" no papel principal. A questão de ser straight ou ser gay é delicada do ponto de vista do indivíduo assumir-se para si e para os outros; a amplitude da aplicação destas palavras às tantas práticas sexuais gera ainda mais confusão mas, do ponto de vista da interpretação, uns exercícios de construção de personagem poderiam resolver essa deficiência que não é exclusiva de Lance Brady.
Tampouco se pode dizer que Brady bebe no gargalo, ele é mais engolidor de pica do que de esperma. Sua atuação consiste em gargarejar, prolongando o lambuza para o delírio dos aficionados. Ele engole só um pouquinho, como um enólogo, não se empanturra do líquido apreciado, não apenas por uma questão de etiqueta que recomenda bons modos na frente estranhos, em qualquer filme pornô tem de sobrar algum líquido para o espetáculo visual. É possível que o leitor já tenha visto alhures engolidas mais convincentes, contudo, a particularidade desse filme, e o que nele interessa sobremaneira, é o nicho específico em que ele se insere, distinto dos filmes em que a engolida é a apoteose de uma metida na bunda. Distinto também do clima sórdido e do clima juvenil que até agora polarizaram as engolidas dos filmes bareback que existem no mercado. Swallow it straight boy certamente encontrará entre os inúmeros gays que possuem aversão, medo mórbido, irracional, desproporcional, persistente e repugnante ao sexo anal seu público específico. Os inúmeros gays que possuem aversão, medo mórbido, irracional, desproporcional, persistente e repugnante a esperma devem evitá-lo.
Brady é um gatinho e seu barbeiro teve o cuidado de fazer um cavanhaque que contorna a boca com um traço fino como quem desenha um alvo para que a pica não se desvie do centro. É um herói que emociona com os super-poderes de engolir pau até o nariz bater nos pentelhos, as bolas no queixo, em movimento coordenado e apnéia. No filme ele chupa mais de dez picas, uma de cada vez, sem fazer suruba. Os créditos só elencam Mario Ortis e “os homens quentes de Nova York”. Ele contracena com Ortiz, um veterano latino, versátil, que já fez filmes para muitas produtoras, como a Jocks (Quarterback Sack, 2003), afiliada da Falcon. Grandão, não-circuncisado que de uns anos para cá ganhou corpo e tatuagens que o tornaram um dos chubbys mais tesudos do pornô gay. A curvatura do pênis de Ortiz favorece a introdução goela abaixo embora a espessura desfavoreça quem não seja bangüela. A gozada dele é uma farta contribuição para o êxito galático do filme, perfeita para observar o processo de liquidificação de uma pica tão sólida. Entretanto a contribuição mais volumosa é também a mais inesperada, pois parte do cameraman que, na ocasião, confessa que estava a mais de uma semana sem gozar. Uma falha do contra-regra foi não ter colocado óculos de mergulho para proteger os olhos de Brady.
A produtora Cum Pig Men é um estúdio americano que, como Lance Brady e Leo Greco, também está no começo da carreira. O estilo que a produtora pretende dar aos seus filmes parece ser do tipo a não se ater muito às normas de higiene recomendados pelos médicos. Seus dois primeiros e únicos filmes são distribuídos no mercado pela Gay Reality Porn, cujo catálogo tem títulos como Butthole Bukakke (ThreshHold Media, 2008), Born to Swallow (Pumphouse Media, 2008) e até raros filmes lésbicos como Working Gilrz (Working Girl Vídeo, 2004), distintos de filmes heteros que empregam mulheres que transam entre si. O outro lançamento da Cum Pig Men é Coat my throat, também dirigido por Leo Greco, com Ryan Raz, um rapaz que chega a Fire Island, vindo de St. Louis, Missouri, para chupar todas as picas do balneário. Fire Island é, possivelmente, o maior ponto de pegação gay da Costa Leste americana, imortalizado em incontáveis filmes, desde de Boys in the Sand (Wakefield Poole, 1971) até a série interminável dirigida por Micahel Lucas intitulada Fire Island Crusing (Lucas Entertainment).
No começo de carreira a crítica pode ser menos rigorosa com atores, diretores e produtoras, dando-lhes crédito além da conta, a ponto de favorecer uns e outros sem, contudo, ser injusta. Essa frouxidão deve ser vista como um incentivo à cultura pornô. O surgimento da equipe da Cum Pig Men é promissor e merece ser apreciado porque revela os sempre bem-vindos neófitos das práticas antigas.
Saiba mais:
CumPigMen
O que me deixa encantado é a simplicidade coesa para falar de tal assunto. Parabéns Boris, adoro tudo isso.
ResponderExcluirFalando de pirulito no mês das crianças? Boris, nós já crescemos, já estamos na fase anal.
ResponderExcluirBabybum.
Como vc consegue fazer uma matéria tão deliciosamente hilária e excitante desse jeito, vc é um gênio cara, adoro todos os seus posts.
ResponderExcluirPornô gay sem pau no cu? Só faltava essa! Esse cara deve ter hemorróidas.
ResponderExcluirCaio Cavalo
Engraçado. Eu tenho um bocão, lábios grossos, garganta profunda, chupo bem. E só por isso todo cara que eu chupa acha que eu adoro chupar. Grande engano, detesto quando o cara se entretem demais e acha que eu vou ficar a noite inteira chupando o pau dele até ele gozar. Me irrito tanto que sou capaz de largar o cara ali mesmo, principalmente se ele resolvi pegar na mminha cabeça, coisa que minha religião não permite. Já deixei muitos com o pau em riste. Bom mesmo é curtir no tanto certo e partir para a penetração. Curto mesmo é levar surra de pica. rsrs...
ResponderExcluirPost muito legal. Filhinho, vamos fundar uma produtora online?
Beijos!
??? Menino G desculpa o comentário, mas isso foi muito estranho, vc chupa rola, leva pisa de pica, mas não podem botar a mão na sua cabeça @_@', que religião é essa? Eu mesmo não conseguiria comer um cara sem pegar na cabeça dele quando tivesse me chupando ou socando pica nele, fica muito mecânico. Mas que é gostoso ser chupado por um cara até dar uma gozada isso eu tenho certeza, bom pelo menos pra quem tá sendo chupado hehehehe.
ResponderExcluirCara...seu blog é tudo de bom...me faz ler ler ler e depois baixar baixar baixar, e logo logo , gozar muito! Gozar muito bem informado! Já nos favoritos! Esperando novo Post!
ResponderExcluirRecomendo a leitura deste texto sobre o amor gay da famosa jornalista portuguesa Fernanda Câncio. Merece ser lido e divulgado. Lindo!
ResponderExcluirEste blog é pernicioso. Os filmes pornôs não merecem tanta consideração.
ResponderExcluirGostei muito do seu blog, cara!!!
ResponderExcluirSeu texto é excelente, parabéns.
Já te coloquei como favorito.
Abraços
Cavanhaque, pra quem não sabe, é um código que, entre alguns grupos gays, indica aqueles que fazem sexo oral completo. Como este usado por Lance Brady no filme.
ResponderExcluirÉ isso aí gente, vamos usar cavanhaque no próximo verão. Não tanto por ser bonito, mas por ser útil.
Caro Boris:
ResponderExcluirAdoro seus textos, você mergulha no assunto para resgatar informações inacessíveis aos leitores. Se o tema não fosse tão "restrito" (não quero usar as palavras marginal/underground porque o pornô já virou indústria), você seria um candidato a receber aqueles troféus que enfeitam as prateleiras de tantos jornalistas com menos mérito.
Estou faminto por uma atualização :)
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